ÁLEF SOUZA CAVALCANTE

“Meu amado filho Álef nunca será esquecido”

Infância

Nascido em 23 de março de 1998, na infância Álef era um menino sapeca e engraçado, trocava as letras das palavras: falava “andão” ao invés de “grandão”, rei e “reia” ao invés de “rei e rainha” e “príncipe e príncipa” ao invés de “príncipe e princesa”. Sensibilidade demonstrada a partir de desenhos aos 6 anos, a infância do menino foi marcada por idas à igreja evangélica, da qual a mãe fazia parte.

Álef nasceu em 23 de março de 1998 e, durante sua infância foi uma criança sapeca

Desde a infância tinha uma forte ligação com a mãe D. Edna, compartilhando que se ele ganhasse um bombom na igreja, ele guardava para dividir com a mãe quando chegasse em casa. Aos 7 anos, Álef não gostava de falar em público, mas participou de uma peça na igreja em homenagem ao Dia das Mães. Em sua apresentação, ele falou que a mãe era a sua heroína.

As recordações da infância de Álef estão entrelaçadas às lembranças de sua irmã, apenas 2 anos mais velha que ele, e companheira em grande parte de suas aventuras. Ela era a passageira e ele o motorista quando brincavam de simular um passeio de ônibus: as crianças usavam as cadeiras de casa como bancos e uma forma de assar bolo como direção do veículo imaginário.

Quando Álef dizia que era pastor, usava gravata e cueca e o cabo de vassoura era a sua guitarra; sua irmã era a cantora da igreja: eles cantavam o hino, falavam “glória a Deus”. D. Edna diz que era divertido, e que eles passavam o dia brincando e brigando, relata essa fase da infância dos filhos com muita saudade.

Adolescência

Durante a adolescência, Álef continuou sendo o menino sensível e solidário com todas e todos ao seu redor. Buscava ajudar as pessoas sempre que tinha oportunidade.  Meses antes de sua morte precoce, assistindo na TV à propaganda para o alistamento de jovens, ele falou para sua mãe que no ano seguinte seria o momento dele. Sua irmã, brincando, disse que ele não seria aceito porque tinha “pés de pato”; porém, sem pensar duas vezes, o menino reafirmou que no ano seguinte estaria vestindo a farda do Exército Brasileiro

Álef gostava de andar de skate e frequentava várias pistas, como a da Av. Raul Barbosa

Álef gostava de andar de skate e frequentava várias pistas, como a da Avenida Raul Barbosa e da Beira Mar (BM). A pista de skate do Centro Urbano de Cultura, Arte, Ciência e Esporte, equipamento da Prefeitura de Fortaleza [Cuca] Jangurussu era a preferida de Álef, ele aproveitava o passeio também para usar o wi-fi gratuito do Cuca. Lá criou laços fortes de amizade com alguns educadores e jovens que frequentavam o local. Ainda no Cuca, Álef passou a participar de oficinas que visavam à construção de estratégias que discutiam melhorias para as periferias de Fortaleza.

11 de novembro de 2015

Alguns dias antes de sua morte, o skate de Álef havia quebrado. D. Edna acredita que se o skate não tivesse quebrado, talvez seu filho estivesse vivo. Como Álef estava sem o brinquedo, usou seu tempo livre para jogar bola na quadra comunitária do Bairro São Cristóvão, com Jardel e demais colegas. Após o jogo, Jardel recebeu uma ligação: era seu primo convidando-o para dar uma volta no Curió; Jardel estendeu o convite aos colegas, mas somente Álef aceitou.

O adolescente tinha o hábito de sempre informar aos seus pais quando ele ia passear, todavia, naquele dia não avisou os familiares que iria àquele local, porque se tivesse dito ninguém ia deixar, segundo D. Edna. Após uma partida de futebol, o que deveria ser uma noite divertida com os amigos findou com o massacre de onze pessoas inocentes, em sua maioria jovens: naquele dia trágico, o menino brincalhão e sonhador foi assassinado

Álef era um jovem branco com seus olhos verdes e fios loiros. Muito vaidoso, ele se olhava no espelho e perguntava: “mãe, eu ‘tou bonito?” — e ela dizia: “é claro que você está bonito, puxou a mamãe!” Gostava de namorar e passear. 

A infância do menino foi marcada por idas à igreja evangélica, da qual a mãe fazia parte

Meses antes de sua morte, Álef terminou o namoro e passou a se relacionar com outras garotas. Sua mãe dizia: “te aquieta, Álef” — e ele respondia: “mãe, a vida é curta”. 

Mesmo após sua morte, Álef continuou surpreendendo a mãe com sua sensibilidade e desejo de ajudar o próximo. D. Edna, orgulhosa das atitudes do filho, relata que no velório do menino uma senhora aproximou-se dela e contou que Álef havia salvado sua vida: um dia, ao atravessar uma rua, a senhora não escutou quando o ônibus estava se aproximando, por possuir comprometimento auditivo; o menino, que estava descendo a rua de skate, puxou-a da frente do veículo. 

“Nesse dia ele chegou todo ralado — e até perguntei se ele tinha brigado, mas ele não me contou nada porque eu não gostava quando ele andava na pista. Então, meu filho era uma pessoa muito abençoada!”, resume dona Edna.

Resumo do texto que consta no livro Onze, organizado pelo Movimento de Mães e Familiares do Curió